TRANSPORTE COLETIVO - 15-01-2016 - 20h56min
Assaltos
tornam-se parte da rotina de motoristas e cobradores
Pânico, depressão, humilhação. Consequências de uma
frase que se repete praticamente todos os dias, quando não mais de uma vez por
dia: "perdeu, perdeu motora". Frase esta que vários motoristas e
cobradores do transporte coletivo estão ouvindo nos assaltos, que,
infelizmente, se tornaram parte da rotina desses trabalhadores. Segundo o
delegado Ronaldo Coelho, titular da Delegacia de Furtos, Roubos, Entorpecentes
e Capturas (Defrec), até o dia 14, foram registrados nove assaltos. Nos 12
meses do ano passado, foram registrados 420.
Segundo as vítimas, as linhas mais perigosas são a
Polivalente, as que passam pela estrada Roberto Socoowski e, agora no verão, a
do Cassino. E a cada dia, os assaltos tornam-se mais e mais violentos. Não só
por causa das armas, mas também dos atos dos criminosos. Não basta o dinheiro
da roleta. Os passageiros começaram a se tornar alvos também. Além disso, atos
brutais foram registrados.
Conforme relatos dos profissionais, uma cobradora,
agora em licença médica, foi brutalmente atacada durante um assalto, cometido
por 10 menores, em um arrastão na linha Cassino/Centro. Não bastasse levar o
dinheiro da roleta e objetos particulares, os assaltantes rasgaram a roupa da
cobradora, tocando-a em todas as partes do corpo. Uma cena difícil de ser
esquecida por quem viu e, principalmente, por quem sentiu na pele o medo e a
humilhação. Este foi um dos assaltos mais violentos até hoje.
Uma outra cobradora também teve sua blusa rasgada e
os seios apalpados. Outros dois motoristas foram esfaqueados sem nem ao menos
terem tentado reagir. Um deles, motorista de seletivo, teve um ferimento que
resultou em uma sutura de 10 pontos. "Quando vejo um suspeito na parada de
ônibus, nem paro mais. Passo direto", frisou outro motorista.
Nesta reportagem, os entrevistados optaram por não
se identificar, por receio de serem reconhecidos pelos assaltantes, o que já
acontece na delegacia de polícia, quando precisam reconhecê-los. "Ficamos
isolados dos marginais por um vidro. Só que para chegar até o local do
reconhecimento, passamos pela família do assaltante e somos, muitas vezes,
ameaçados pelos parentes", informou. Os relatos são de que há
motoristas com vítimas de 25 assaltos, outros com 15 e 10.
Delinquentes e menores
O grande problema dos assaltos, hoje, é em relação
aos que na maioria os cometem: os menores. "Somos pegos de surpresa. Na
hora a gente nem sabe o que faz. Quando fui assaltado, fiquei olhando para o
menor, de 16 anos, pensando se reagia ou não. Resolvi que não valia a pena
morrer por um celular ou um troco", relatou um motorista, que já sofreu
dois assaltos. Ele conta que quando o assaltante entra sem mostrar a arma, tudo
corre mais tranquilo. "Mas quando a gente vê um revólver apontado pra
nossa cabeça, ou uma faca na mão de quem tá doidão, dá um calafrio. A gente fica completamente
desorientado frente a uma ameaça armada".
Trabalhar, hoje, em transporte coletivo significa
desconfiar de qualquer pessoa. "Se um passageiro entra e tem uma atitude
qualquer que levante suspeita, em nossa cabeça, já passa rápido a ideia de que
vamos sofrer outro assalto. Isso é terrível. Trabalhar sob pressão é a pior
coisa que existe. Já temos a pressão da família, pois saímos de casa sabendo
que os familiares estão apavorados, pensando que você vai enfrentar mais
criminosos na sua rotina de trabalho. Não é fácil. Mas é preciso não deixar que
isso afete você, senão ninguém mais vai trabalhar", salienta outro
motorista.
Segundo ele, a mulher, em casa, fica apavorada, só
na espera do marido chegar. "Ela está muito assustada, sempre ligando pra
ver se estou bem. Se me atraso um pouco, já bate o pânico. Já pensei em
desistir, mas temos família e temos que continuar. Temos que pensar que hoje a
violência se instalou em nossa sociedade, e assaltos ocorrem em qualquer lugar,
em todas as profissões", alegou.
Uma cobradora foi "premiada" em seu
primeiro dia de trabalho. "Foi tudo muito rápido. Havia três passageiros
no ônibus. Quando vi, já tinha acontecido. O pânico bateu no outro dia. Hoje,
vivo apavorada. Tenho muito medo porque não sei o que pode acontecer. Estamos à
mercê de um tiro, de uma facada por causa de uns trocados. Rezo todos os dias,
pedindo proteção quando saio pra trabalhar e agradeço quando volto". Ela
ressalta que o medo é por não saber qual será sua reação em um assalto que pode
se prolongar um pouco mais. O medo também é de que aconteça com ela o que
aconteceu com a colega, que teve as roupas rasgadas e ainda foi abusada pelos
assaltantes.
Com 20 dias de empresa, outra cobradora acumulou
dois assaltos. "No primeiro, fui me dar conta do perigo pouco depois,
quando congelei. No segundo, entrou um com a mão dentro do bolso do moletom
canguru e o outro ficou na porta com uma arma apontada para o motorista. Dessa
vez entrei em choque. Só conseguia chorar", lembrou a cobradora. Os dois
assaltos aconteceram na linha Polivalente. Além do dinheiro da gaveta, levaram
os celulares dos dois profissionais.
Só por necessidade
O relato de outra cobradora, a seguir, mostra que
não só o medo faz parte dos assaltos. A humilhação a que são expostos é outro
ponto grave. "Me senti um lixo perante esses delinquentes. Não dá pra
esquecer. Não vou esquecer nunca", diz ela, frisando que o assalto foi
cometido por um homem armado com uma faca. "Ele entrou no ônibus e
anunciou o assalto, apontando a faca para o motorista. Hoje vivo e trabalho com
medo, sempre apreensiva. Já pensei em parar, só não o fiz por necessidade. Mas
se fizerem comigo o que fizeram com minha colega, talvez, eu nem sente mais
atrás de uma roleta".
A depressão faz parte da vida de uma outra
profissional. Ela não foi assaltada. Mas sofre com a pressão diária, pois rende
os assaltados. "Nunca fui assaltada. Mas sei o que é o pânico, pois vejo
nos rostos dos meus colegas. Estou em depressão por estresse traumático de
assalto. Nenhum de nós tem tranquilidade. É um alívio quando chegamos no final
da jornada".
Cofres
Para um outro motorista, que também já foi
assaltado, o importante neste momento é achar uma solução para minimizar o
crescimento avassalador dos assaltos. "Uma das medidas para evitar os
assaltos a ônibus são os cofres boca de lobo já utilizados por algumas empresas de
transporte coletivo, que não podem ser abertos pelos funcionários. São caixa de
ferro ou aço com fechadura ou senha.
Em ambos, o dinheiro é colocado, mas não
pode ser retirado, a não ser na garagem, onde encontra-se a chave. O valor em
mãos, do cobrador, para troco, não passaria de 10 vezes o valor da passagem, ou
seja R$ 30 (levando-se em consideração que a tarifa, hoje, é de R$ 3), o que já
é determinado por lei municipal. Mas, para que uma medida deste âmbito venha
acontecer no transporte público de nossa cidade, teríamos que ter uma
mobilização do Legislativo", acredita.
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